Andava
entediado.
Uma certa sensação de fastio da vida. E que não
viessem perguntar o porquê!
Nesse dia as
coisas pareciam ainda piores. O dia parecia mais feio. A gata parecia mais
arredia. O Seu Dirceu da padaria parecia mais carrancudo e o pai parecia mais
bravo do que de costume.
Só a vó...
só ela continuava com o mesmo olhar doce e amoroso e com o colo aconchegante,
que foi onde ele resolveu buscar certo acolhimento.
A vó não
perguntou nada, porque já sabia. Ela sempre sabia. A vó apenas sussurrou uma
canção que, de alguma maneira, fez um afago no coração do menino que se aninhou
ainda mais.
Sempre
pensei em avós como anjos, desses que Deus modela com muito cuidado e com dose
cavalar de amor e compreensão. Dizem que mãe tem sexto sentido... e eu diria
que vó tem sétimo!!! Elas sabem de tudo o que se passa dentro da gente! Pelo
menos essas, que se deixaram moldar pra serem anjos!
O menino
tanto se aninhou ali, que acabou cochilando. E sonhou...
O bom dos
sonhos é que não precisam ter sentido algum, nem pra nós, nem pra ninguém. O
bom também é que a gente pode consertar tudo de errado quando sonhamos. E mesmo
que a solução seja passageira e dure apenas até a gente acordar, nos sentimos
aliviados do peso da vida por algum tempo... fora que podemos voltar a sonhar!
E ele
sonhou...
Via sua mãe,
vestida como se fosse pra festa. - Como estou? - ela lhe perguntava; e ele respondia
- Linda como sempre! E os dois sorriam, davam as mãos e saíam andando juntos,
iam ficando pequenininhos, pequenininhos até sumirem.
Ele despertou
esboçando um discreto sorriso, abriu os olhos e viu os olhos sorridentes da vó,
que lhe perguntou:
- Estava
sonhando?
- Sim
- E era bom,
né?
- Mamãe
estava linda! Íamos pra festa juntos!
- Ela vai
voltar, não se preocupe.
- Tô com
saudades, vó!
- Eu sei...
também estou...
- Será que
ela pensa em nós? Será que ela sente saudade de mim?
- Com
certeza! Quem uma vez aprendeu a te amar, quando estiver longe sempre vai sentir saudades!
- Não sei...
- Vamos lá comer
o bolo que a Tinãna fez?
- Não sei...
- Mas você
gosta tanto dos bolos dela! Vamos!
- A Tinãna é
nossa parenta, vó?
- Não, por
quê?
- Só passou
pela cabeça. Você sempre conta que ela mora aqui há tanto tempo.
- É, nesse
caso é como se fosse mesmo, né?
- Vó? ...
- Oi?
- Que cor
tem a tristeza?
- Cinza,
será?
- Estou me
sentindo cinza hoje!
- É só a
saudade. Vai passar! E se a gente for comer o bolo, passa mais rápido ainda!
- Vó, e a alegria?
- Azul? Não
sei... acho que a alegria é colorida!
- É, faz
sentido! Queria me sentir mais colorido de vez em quando!
- E como
você acha que isso pode acontecer?
- Não sei.
Talvez tentando colorir cada dia cinza com uma cor diferente que aparecer, até
misturar tudo e ficar colorido!
- Sabe de
uma coisa? Você é colorido pra mim! Mesmo quando você diz que se sente cinza!
- Vó? ...
- Oi?
- Obrigado!
- Como
assim?
- Você
acabou de me dar uma cor! E hoje à noite, quando eu sonhar de novo com a mamãe,
vou ter mais uma, quem sabe duas ou mais? E se o papai não estiver bravo comigo
amanhã, eu junto outra ainda... É, acho que nem vai ser tão difícil, né?
- Viu? Vem
com a vó! Vamos lá comer o bolo e, quem sabe, a gente não encontra outras cores
pelo caminho?